quinta-feira, outubro 30, 2008


Vou levando
mas não na valsa
que nesta dança
a vida
me pisou no pé.

Wilson Roberto Nogueira
Uma foto que fala ao coração das trevas
na face oculta por um brilho opaco
diante de um espelho partido onde
escorre a tinta sangüinea do pesadêlo.
O vento bate à porta que reage rangendo
maldições só por instantes
tossindo crepitam corvos em carvalhos sêcos.
Outra foto que fala ao coração das trevas,
na névoa da manhã sombras asombram
assanhando sonhos de insandecidos bruxuleios
caminham casais entre as lápides.
Só o sonho de uma foto que se incendeia
furando a mortalha de estrelas.
A efêmera fogueira que copula com a esperança
num poema que sangra no silente cio.
Wilson Roberto Nogueira

O Sonho da Sombra

A vovózinha SuIen, com pano na cabeça e avental amarrado à cintura, a cortar a carninha para a netinha, e Su-Lin, a pequenina pequinesa - comensais da mesma tijela trincada. No ano novo Su-Lin foi para o prato e a netinha - pro mercado ver se levantava, com suas lágrimas, alguma gôtas de oiro para a querida vovó na calçada da esquina da Adaga Cega - onde conseguiu enfim, ótimo preço!
Wilson Roberto Nogueira

Sobras

Na textura do percaminho
veias assinam o teu caminhar
a viagem sanguinea arde
mas não é uma demi-morta o viajar
é transplantar o hálito doutra alma
no amar dançando na incerteza .

Wilson Roberto Nogueira
Passara os dias em penúmbra ,
quando saía ,
torcia sombras
garroteando o pescoço da verdade
sentindo a carne pulsar
ferver até..

sobrou apenas pedaço de barro
de um vaso barato quebrado
na escrita de uma sombra rasa.

Wilson Roberto Nogueira
Um pássaro catando lágrimas
do vento
beija num canto solitário
o encanto de viver.
No resto do dia
alimenta-se da fantasia
daquela criança
que mesmo de barriga vazia
sorria para as nuvens
a imaginar carruagens e anjos
Enquanto em volta de sí
as sombras
se banqueteiam nas ruínas.

Wilson Roberto Nogueira
Você,
que sozinho sonha
multidões,
reflexos dos olhares
ocultos
sob as pálpebras
do esquecimento.
Aqui jaz
uma abantesma
que assombra-te,
mas te desperta
sussurrando...
Wilson Roberto Nogueira
Fecha a janela e se encapsúla nela
e perde-se no espaço
enevôa-se a mente ela
está em segunda.

Diga a sí numa segunda sem feira
nem samba no coração.

Wilson Roberto Nogueira

Semeador de Sementes de Serpentes

Só estando louco pôde o Tirano olhar para as entranhas dos seus crimes. Mesmo assim, insano assassino, beija a bela filha papai atencioso. Não fuma outra fumaça, que aquela emanada do carvão de suas vítimas , não bebe outra bebida que o sangue de sua vingança. Ao olhar para dentro de sí ,encontrou as trevas quentes de sua íntima felicidade.

A Guerra a gargalhar ,a miséria mãe da Fome a bajular da Guerra a dádiva O ouro negro, o poder a opressão a oração ao bom Deus do democrático e abençoado direito de matar e oprimir em seu Nome.

Um brinde à insanidade dos governos e seus opositores e a gente simples que recolhe seus pedaços.
Wilson Roberto Nogueira

the soldier drinks (1912)


quarta-feira, outubro 29, 2008

Cortei a corda.Botei minha Verdade no papel

Cortei a corda. Botei minha Verdade no papel.

Quando nasce como todas, qualquer pessoa,
Vem ligada a alguém, para ter cortado o cordão,
Deveria na seqüência privilegiada, sentir-se livre,
Para a nada ou coisa alguma, nunca mais se prender.

Mas há uma voz muda que na consciência ecoa,
Fazendo que em grupo seja ouvido o bordão,
"Sem direito a vida, a liberdade se prive",
E em tempo de vivência, aprisione o Ser.

Existem pessoas que inventam umbigos outros,
E se dão a enfrentamentos que nada trazem,
Espelham-se em imagens que pensam tê-las,
Sentindo o frio ..., delicioso, e sem ler as entrelinhas.

Pensam prazeres, mas vivem ilusão atroz,
Assim seguem ..., e para mudar nada fazem,
E ao invés de alçarem-se livre, às estrelas,
Rumo ao chão, sentem-se pequenininhas.

Pois o ser que quando se sabe livre ..., voa,
Só fica preso pelo humano, como marionetes,
Amarradas sem vida, mas com movimentos,
E quando volta a lida, é para o mundo caduco.

Pois aquele grito mudo, no ouvido ainda ecoa,
E ficam as pessoas secas de lágrimas como se inertes,
Em medos e máscaras que não mostram sentimentos,
Ajudando o semelhante, a permanecer maluco.

Assim essas pessoas mantenhem-se a nada incorporadas,
Pensam-se almas unidas no fundo dos abismos,
Excluem-se depois de cada coisa que foi usada,

E permanecem assim para sempre, gêmeas do nada.


Corte a corda ..., e ponha a sua verdade no papel.

Olinto Simões

terça-feira, outubro 21, 2008

merde

É de uma velhicidade
velha cidade feliz
entre os vales
entre os olhares
ao sabor dos cafés
mesmo sem cafunés
seus carinhos na vaidade
irradiam de luz o rosto da atriz.
Wilson Roberto Nogueira
http://blog.uncovering.org
A agulha risca o disco,
corre a corrida enfarpelada,
faixa por feiche enquanto a
música do tempo não para.
Em cada ferida endoidecida
na epiderme da palavra
uma nova canção jogada fora
da estrada descaminhada
alados fiapos perdidos
libertos para onde ?
fogem do faminto horizonte
horrível multifronte
a agulha amputa a melodia
sub verte o sentimento na desatinação
do desalinho
Ela olha o olho do espelho espera na luz
a menina brilhar enquanto a radiola insiste
em desafiar a agulha que risca na carreira o mel do dia
Ela olha no olho do espelho que a lê menina nos sonhos
da garoa ,o vidro chora ou é a garoa la fora.
a agulha não tem nada ver com isso risca uma nova canção
Ela não ouve mais o coração dormiu
miou o gato e partiu .
Wilson Roberto Nogueira
ê
http://www.dw-world.de

quarta-feira, outubro 15, 2008

semente de tocaia

Passava a piaçava na rubra terra escaldante
assentando o chão sobre a palavra da palavra
cerrada
dentro do grito da semente ausente centelha
naquele paredão deitado no árido mar do sertão
uma cova rasa calada no anônimato
Uma flechada de fogo perfurou o pulmão
da escrava condição parelha
a moeda mordida ,ouro de tolo
da dignidade exigida
o Cão no papo amarelo descansando à sombra
a espera da vassoura parar de varrer o pó
do pó da terra o pó humano aD'us
o pó sobre o pó do jarro quebrado a sonhar
que o dinheiro é liberdade e o povo não é gado
nem aqui nem na cidade
com os cobres o cobertor é quente no inferno.
Wilson Roberto Nogueira

trilhando sobre ramos
llorando sob páramos
sorvendo luares em gotas
de prata
lascas de metal a rasgar
a carne barata
nadando nonada
vazio de Ser
éter...
Wilson Roberto Nogueira

sexta-feira, outubro 10, 2008

domovoi

A criança olha para dentro do fogo
que dança no crepitar da lenha,
e se vê ela própria a dançar
de mãos dadas com as chamas do imaginar.
Ela sorri enquanto atira
para animar o baile das labaredas
mais mirrados gravetos.
Mas a festa acabou
quando
a mãe a agarrou
e para longe da lareira
a levou.Protegendo-a
dos diabos ocultos nos fogos dos lares
habitantes das lareiras e fogueiras
esperando por uma mãozinha de criança pro jantar.
A mãe se persignou e diante do Sagrado Ícone orou.
Lá fora o vento cantava uma melodia para a alcatéia
sonhar que estava saciada de sua milenar fome.
Mais uma noite sob o cobertor cinza.
Wilson Roberto Nogueira
Antes de ver
Haver sonhado
Antes de ter
Saber ter caminhado
na busca do ser.
Ver antes mais além
entre as sombras brancas
na neve escura a cura
para a cegueira
entre tantas
fogueiras fritando no silêncio
a fria chama dos holofotes.
Wilson Roberto Nogueira

quarta-feira, outubro 08, 2008

Traças e Lagartixas

Não encontrei a camiseta listrada, as traças se prenderam nela. Elas se amarram em listras. Vivem à margem e a espreita. São muito cultas e tímidas, não gostam de luzes fugazes. A vida delas é breve, então para que tantas luzes?

Embora elas amem as palavras, as devoram, como umas "alfacinhas" , qual lisboetas da Alfama.

As pessoas só se ocupam delas quando encontram caminhos indesejáveis e "buracos negros " naquele livro tão precioso. Viva os e-books e notebooks ! ? Existem formigas que apreciam o "tempero " dos conduítes e chips.

Quanto aos meus bolsos...

Há muito tempo que elas comeram o fundo dos meus bolsos. Bom, eu nunca tive fundos para depositar, mesmo no raso dos bolsilhos.

Famintas essas leitoras de Flaubert, as vezes flertando com Dostoievsky.Elas não recusam as saborosas letras imortais.Gostavam de nanquim agora qualquer tinta fast-food made in China está servindo.

Naftalina!? Não! Sou contra toda forma de genocídio,não mato uma mosca,quanto mais uma aplicada traça burocrata. Ela só quer um papel,um pano ou uma célula morta,Não é muito.

Até a visita da lagartixa. Agora os passos, os traços da traça estão mudos. Nenhum mistério novo na página do romance, nenhum caminho de ausências nos panos e nos papéis. A fome ficou ágrafa.

A lagartixa fica ali, com sua presença verde mas quando precisa e lhe apetece fica da cor da parede,principalmente quando namora,mas na maior parte do tempo,fica lá no teto,muda, lagarteando perto da lâmpada dando uma de "João Sem- Braço" para comer uma incauta mariposa.Olha para baixo curiosa com as humanas insanidades do escrivinhador, agora sem suas fiéis leitoras, as traças, assassinadas pela sanha insaciável da nova moradora, a qual não lê mas filosofa num estilo... meio zen... meio existencialista,uma observadora do cotidiano...
Wilson Roberto Nogueira

view of toledo (c1597)


Deitado no divã divaguei
e no meio da travessia do
delírio cai em mim.
esmagado gozei gazes de
páprika
Cadente como um cometa
riscando arrisquei
o céu prenunciando no prepúcio
da decadência
a ejaculaçõa precoce da abundancia
inútil da esperança
O desespero das asas que perderam os braços
E só os lençóis soluçando viúvas tão tenras
na areia doce de suas pêras.
Para escrever mnha estória na sêda de seu corpo
não logrei legar sequer uma letra sem rasgá-la
na fibra mais delicada de seu perfume.
Wilson Roberto Nogueira

the shootings of may third1808


http://www3.hi.is/~gylfason/painting.htm

encontro de perdidos

A bala insandecida procura um coração generoso de ,uma alma perdida.

Um risco traçando na noite até o ponto final sob o olhar de prata.A única testemunha a lua,
silenciosa amante,velando a última chama no hálito do último beijo.Não há vagas no necrotério-só valas a céu aberto-,mesmo morto continua um sem-teto; aguarda-se que encontre condução,contudo a mercadoria espera.Não tem valor.Não tem fígado,não tem rins,coração imenso-tudo devorado."Caíra a casa " do malandro ( ?) (desde sempre).E quem o encontrou na última esquina do último bar: uma bela bala perdida de uma máquina gringa da mão de um "soldado"de dez anos que atirou para impressionar uma gostosa "cachorra" .

Chove em fim batizando de cachaça e cocaína o esgoto da Babilonia.

Wilson Roberto Nogueira

Berlin street scene (1930)


quinta-feira, outubro 02, 2008

Voce

eu que por pouco não sou transparente
apesar de minha solidez aflitiva
filho de todas as razias
eu que por mais um pouco seria invisível

que saio de casa para entrar no mundo
que enxergo, como henrika,
peixes nas poças de chuva

eu que sou um franciscano brutal
que alimento os pombos com parafusos
um relógio onde o tempo se estraga
que nunca superei as drogas
que não venci aquela paixão
que não posso ver uma mesa de cartas

eu que como papel entre
tragos de tinta
que tenho a chave para as praças da cidade

eu que bebo com os cavalos as águas estigiais
que oxido a lua de urina
que construí escadas que vão dar no teto – como
madame winchester –
que inventei janelas inacessíveis
construí mansardas sem alicerces
na mudança meus fantasmas
e uma mitologia de cães cegos

eu que sou esta florescência de miasmas
cuja alegria é uma careta
cujo sangue é de auroras
cujos ossos são de tijolos e a alma
de querosene

meu sonho será apodrecer
exalando música

eu que guardo uma gaivota na traquéia
que tenho cabelos no coração
e rins de diamante

que saio pelas ruas, charanga de calúnias
que vadio as estrelas
que desconfio dos poderes sobrenaturais
da linguagem
e ainda assim digo, grito desesperadamente as coisas
como arrastado por um desacampamento
de ciganos, como se uma guerra (ou uma saudade)
começasse por minha causa
como se um mágico tirasse moedas de minha
boca e as esferográficas guardassem a velha
herança das navalhas ruins,
como se houvesse fios de alta-tensão
entre nossos corpos

eu que vivo o precário vaudeville dos instantes
que aprendi a dar cambalhotas
com os bobos
de shakespeare e os retardados
cujo bom-senso é o estopim da combustão
cujo reino é uma cratera
cuja coroa é o nariz
do palhaço, e o assassinato um ressuscitar-se

eu que sou, às 4:00 da manhã,
a única janela acesa que me intoxico de deus
que perdi a identidade, o ônibus, a graça
e os sisos e o bilhete premiado
e o fio de ariadne,
a lembrança do inferno e do paraíso

e volto para casa sangrando
como quem assobiasse

eu que faço parelhas aos afogados
que sempre quis ser o poeta de tróia
o poeta da boca-de-fumo, o poeta de porta-de-cadeia
o poeta dos obituários, o poeta oficial das alvoradas,
o poeta oficial da vila hauer
e que, ao fim, não sou poeta oficial
nem de mim mesmo

eu que toco trombone
dentro de uma piscina vazia
eu que tenho queimaduras de terceiro grau
por dentro que cato os rebotalhos da cultura materialista
e reciclo
do jeito que dá e não dá
e junco de esperança
todos os impedimentos

eu, exilado do país infinito
que manipulo venenos, que enlouqueço sozinho
um ser fronteiriço
entre azul e precipício
e subo a montanha
como um profeta que engoliu a língua

eu que escovo os dentes
com chuva e maçarico

eu, meu corpo
que tenho a espessura da vida
e o peso exato de minha morte

eu
coluna de fumaça
espelho quando mente
ferragem retorcida
rosto em branco, sem traços (como um edifício ou um anjo
transitório)
minha cara inconfundível

uma palavra
(r
el
âm
pa
g
o) que não acaba nunca


Rodrigo Madeira
Suspira o vento
velando a lágrima
que mareja a lagoa
Solar de uma mirada
enluarando o espelho
da alma
nadam pupilas
procurando no fundo
tesouros de oceanos
na concha de um caramujo.
Wilson Roberto Nogueira

quarta-feira, outubro 01, 2008

celeste em tarde nascer

sequestrei o sol do teu sorriso,
o escondi e dele me alimentei

quando voltei para sugar
silêncioso, mais do teu calor

encontrei tua alma
com um sorriso sem dentes.

um estreito riacho sem pedras
preciosas

seus olhos, azulescência pura,
eram agora o fundo de um lago

sem o soul da sereia que dançava
em ti.sequestrei o sol da sua alma

agora escravo
vago condenado

assassino da tua luz.

Wilson Roberto Nogueira

O Guardião das Horas

Não sou feito de aço,
eu enferrujo, por isso evito ventos fortes
lágrimas à toa.
Como da primeira vez.
Pareço feito de areia,
então escorreguei por entre seus dedos.
Mas foi a última vez.

Sou um bandido alado, impreciso,
roubo a substância do abstrato.
Me comunico em
panfletos colados nos postes, cartazes nos tapumes,
muros piccahdos, estampas de camiseta,
adesivo de carro.
Tenho apenas cincosentidos,
todos voltados para a contra-mão,
e mesmo assim reconheceria a sua voz até no inferno.

Eu viajei vezes e vezes por você
sempre um segundo atrasado
leve, leve, leve e esperei...
as 7 voltas nas muralhas de Jericó
os 3 dias pela ressureição
os cem anos de guerra e solidão
os nove meses no ventre da tua mãe
mas somente aprendi as leis do tempo
quando li as linhas da tua mão.

A poesia não espera pela inspiração
o amor não espera amadurecer
a dor não espera o perdão
a fome não espera a sede
a vida não espera o fim do expediente
o sol nunca espera pela lua
e eu não espero mais por você.

Luiz Belmiro Teixeira

Menção honrosa prêmio Helena kolody de Poesia 2007