segunda-feira, dezembro 17, 2018

A caixa vazia




Alí estava aquele aluno, escarrapachado na primeira fila ; andrajoso em suas calças puídas , a camisa amassada, os dedos querendo fugir do maltratado chinelo, os braços tais quais galhos secos cruzados sobre o adiposo abdome , o rosto amassado escondido sob uma roça mal cuidada com uma expressão que misturava um olhar severo e uma cicatriz que parecia um sorriso ocultando dentes tortos .
Passava o tempo  oculto, imerso  sob os livros. Quando lhe dirigiam a palavra respondia laconicamente , a não ser quando pediam explicações sobre  assunto que  dominasse ,daí  era possuído pelo  espirito de um professor , era reputado como intelectual batizado pela massa aprendiz com a alcunha “O Crânio “ . O crânio tinha a voz monótona de locutor de “a voz do Brasil “, quem a ouvisse dormiria no ato tal seu poder soporífero.
O Crânio era aplicadíssimo nas aulas de humanas, passava o tempo todo a inquirir e tecer comentários com os professores e professoras sobre as matérias ; o programa de uma aula se estendia a três , o que irritava os demais alunos , os quais tornavam –se conspiradores contra aquilo que supunham ser interferência indevida no andamento normal das aulas .
Entretanto nas aulas de química e biologia o Crânio era acometido pela doença do sono enquanto as portas do inferno se abriam nas disciplinas de exatas onde o mesmo sentia o sofrimento e a angústia de estar fritando nas grelhas de satanás .
Pobre alma sua existência era uma contradição e sua alcunha ria a larga de si própria.

Wilson Roberto Nogueira . Piraí do Sul. 26/12/1995

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